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- Categoria: Saúde
- By fabio
Dependência química pode estar ligada ao grau de pureza
Pesquisa desenvolvida na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP mostra que o nível de dependência causado por uma droga pode estar relacionado ao grau de pureza dela. A hipótese é levantada por André Rinaldi Fukushima e da professora Alice Aparecida da Matta Chasin, que estudou o Perfil da cocaína comercializada como crack na região Metropolitana de São Paulo em período de vinte meses (2008-2009), em dezembro de 2010.
O objetivo da pesquisa era analisar as drogas apreendidas como crack na Grande São Paulo, entre março de 2008 e novembro de 2009, e relacionar os resultados a danos causados por elas à saúde.
A pesquisa contou com o apoio da Polícia Técnico-Científica (PTC). Após a apreensão, as drogas vendidas como crack eram encaminhadas para a delegacia. De lá seguiam para o Instituto de Criminalística (IC), que retirava dois gramas da droga para análise e contraperícia. “Dessa amostra eu retirava uma ou duas pedras e fazia uma análise por meio da técnica cromatográfica gasosa, que possibilita a separação, quantificação e caracterização das substâncias existentes no material”, afirma Fukushima. Foram analisadas 404 pedras de crack. Segundo ele, os adulterantes mais encontrados eram a cafeína, lidocaína e a benzocaína. Identificar quais são os principais adulterantes da droga ajuda a caracterizar a rota do tráfico em determinada época e região.
Laboratórios
A pesquisa utilizou diferentes laboratórios para diferentes tipos de análises. A amostragem era feita no Núcleo de Exames de Entorpecentes (NEE) do IC. A análise cromatográfica gasosa da fumaça era feita em um equipamento chamado cromatógrafo gasoso acoplado a um espectrômetro de massas, presente no Laboratório de Análise de Gases, do Centro de Química e Meio Ambiente (CQMA) do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), coordenado por José Oscar Vega Bustillos. Na fumaça foram encontradas 12 compostos diferentes que possuem impacto direto na saúde do usuário.
“Foi observado que a substância bezoilecgonina é esse principal produto”, diz Fukushima, a bezoilecgonina é o principal produto de degradação por hidrólise do crack. A presença dessa substância em exames de urina ou de esgoto é indício de que houve consumo de alguma forma de cocaína.
Já no laboratório do Núcleo de Toxicologia Forense (NTF) do Instituto Médico Legal (IML), o pesquisador fez a análise de adulterantes com a perita Débora Gonçalves Carvalho, responsável pela rotina de análises de casos de cocaína, que defendeu em 2000, na FCF, uma pesquisa semelhante à de Fukushima. O seu foco, porém, era a análise de cocaína em pó.
Débora analisou 389 amostras, 20% do total de apreensões realizadas na Região Metropolitana de São Paulo em 1997. Ela constatou uma concentração média de cerca de 38% de cocaína. Já Fukushima encontrou na cocaína em pedra uma pureza média de 71,3%. “Por conta desses dados, eu questiono: será que o nível de dependência não seria relacionado também à concentração de cocaína presente na droga? Talvez pelo crack apresentar um nível de pureza média muito mais alto que a cocaína em pó, seus usuários possuem maior potencial de abuso e sofrem mais problemas de saúde que os usuários de cocaína”, afirma.
Resultado negativo
Houve apenas uma amostra negativa em toda a pesquisa. “A amostra foi levada para análise no IML e o resultado deu negativo. Depois, uma perita do NEE, Mariana Portugal, cedeu uma amostra para que eu analisasse, já que os nossos métodos eram diferentes. E o resultado foi negativo também. O material apreendido não era crack”, afirma Fukushima. Ele ainda ressalta que em toda a pesquisa, nenhuma de suas análises divergiu das análises do mesmo material feita pelo IC.
Segundo Débora, é mais comum encontrar amostras negativas na cocaína em pó do que em outras formas da substância, como o crack. “Na minha amostragem 4,4 % dos casos foram negativos. Dentre essas amostras, nas quais não se detectou cocaína, a totalidade era composta por diluentes, na maioria carbonatos ou bicarbonatos”, explica.
Outro resultado interessante foi desmentir que a cor da droga influência no seu efeito. “Os usuários dizem que as pedras amareladas têm um efeito mais forte, embora analiticamente isso não possa ser afirmado”, explica Fukushima.
Por Victor Francisco Ferreira - Agência/USP